

Introdução
Vira-e-mexe alguém brinca comigo dizendo alguma gracinha do tipo “você é sortudo de receber material de graça dos fabricantes”. Como a maioria dos nossos leitores realmente acha que a gente ganha as peças que testamos sem qualquer custo, resolvi sentar e explicar que o que realmente acontece por aqui.
Vamos separar os fabricantes em dois tipos: os que têm representação no Brasil (seja através de escritório, assessoria de imprensa ou distribuidor oficial) e os que não têm.
O primeiro grupo, que inclui marcas como AMD, Intel, ATI, NVIDIA, Samsung e MSI, nos envia material para testes em caráter de empréstimo. Ou seja, ao contrário do que ocorre com mídias de outros países, o material não fica para nós. E normalmente ainda temos de arcar com o custo (frete) da devolução do material.
Essa coisa de termos de devolver o material é um porre e é a razão pela qual demoramos uma eternidade para atualizarmos nossas metodologias de teste: quando queremos mudar algo em nossa bancada – por exemplo, aumentar a quantidade de memória RAM da máquina de testes – temos de coletar novamente os dados de todas as placas já testadas. Como não temos mais as placas, torna-se um procedimento complicadíssimo. Eu já falei bastante deste problema naquele editorial onde desci o pau na Intel porque ela não queria mandar processadores Pentium D para testes.
O segundo grupo pode ser dividido em dois subgrupos: os que não querem mandar material para testes porque não entendem nada de marketing e ignoram sua importância (atualmente somente a ASUS e a ASRock fazem parte deste grupo) e os demais fabricantes, que querem colaborar conosco enviando material.
Deste último grupo nós recebemos o material “de graça”, mas tem um porém. O custo do imposto de importação corre por nossa conta. Mensalmente nós pagamos uma baba em impostos para que você tenha acesso a testes dos últimos lançamentos. Só que não há nada “de graça” aí, agradeça ao Sr. Presidente: o imposto de importação é de 100%* se o material for enviado via courrier (Fedex, UPS, DHL, TNT, etc) ou de 60% sobre o valor do produto mais o custo da postagem se o material for enviado pelo correio – o que acaba dando a mesma coisa se o produto custar até US$ 100. Ou seja, a gente paga o valor do produto para recebê-lo!
* Em relação aos 100% de imposto, o cálculo é o seguinte: 60% de imposto de importação sobre o valor do produto mais 19% de ICMS sobre o valor do produto mais o valor do imposto de importação (sim, imposto sobre imposto), mais a “taxa de desembaraço” cobrada pelo courrier, normalmente de US$ 10 a US$ 20. Para um produto que custa US$ 100 (uma placa-mãe, por exemplo), o valor dos impostos será de US$ 60 (II) + US$ 30,40 (ICMS) + US$ 10 (tarifa de desembaraço), ou seja, US$ 100,40, 100% do valor do produto.
Isso quando a Receita Federal não implica conosco. Em muitos casos eles contestam o valor do produto que o fabricante declarou e arbitram um novo valor, baseado no valor de um produto similar no mercado nacional. Isto mesmo, você leu certo. Eles calculam o valor do produto com base no valor de um produto similar já dentro do mercado nacional, já com todos os impostos aplicados. Quando isso ocorre pagamos mais caro do que o produto vale, só para termos acesso a ele antes da sua chegada ao mercado.
E não adianta pedir para os fabricantes colocarem um valor “simbólico” ou menor (subfaturar), é pior ainda. Quando isso ocorre, o fiscal da Receita aplica uma multa de 50%, calculada entre a diferença do valor declarado e o valor arbitrado.
Não acredita nesta história toda? Veja abaixo a nota de importação de uma fonte de alimentação que acabamos de receber via Correio (eu apaguei meus dados pessoais por motivos de segurança), para a qual foi arbitrado um valor de US$ 200. Pagamos R$ 355 para recebê-la.
Eu não vou discorrer aqui sobre o que eu acho do sistema tributário brasileiro pois pretendo escrever um novo editorial na série Impostos Que Matam criticando o imposto de importação. Em resumo acho que esse sistema só estimula o contrabando.
O que fazemos com o material que recebemos “de graça” (ou seria melhor dizer “que somos obrigados a comprar do governo brasileiro”) e que não vamos mais usar? Nós sorteamos gratuitamente aqui todos os meses – e tome mais custo, visto que enviamos as peças por Sedex, em geral para cidades bem distantes da nossa. Aliás, depois preciso escrever algo sobre como é complicado e caro registrar um sorteio na Caixa Econômica Federal (basicamente temos que pagar 100% em impostos – olha o nosso presidente “camarada” aí de novo).
O que outros sites similares ao nosso no exterior fazem? Eles vendem o material. Isto pode ser comprovado por esta afirmação do Nathan Kirsch do site LegitReviews: “most review sites sell or ebay their product samples after the review”. E olha que os sites norte-americanos não precisam pagar nada para receber os produtos.
Nós tentamos fazer isso durante um tempo para tentar tapar essa enorme cratera em nosso orçamento, mas fomos duramente criticados, recebemos uma enxurrada de e-mails nos acusando das palavras mais obscenas, e vários e-mails nos “denunciando” para os fabricantes (como se os fabricantes não soubessem).
Isso me lembra aquela piada do vendedor de caranguejos. O cara tinha três cestos, dois tampados e um destampado. Passou um freguês e perguntou se ele não tinha medo que os caranguejos do cesto destampado fugissem. Ele respondeu: “Não preciso me preocupar, pois esses aí são caranguejos brasileiros, quando um sobe os outros todos o puxam para baixo”.
Isso só comprova o que eu costumo falar: temos de ser pelo menos três vezes melhores do que qualquer estrangeiro na mesma posição para termos sucesso no Brasil.
Em resumo, apesar de o teste de um produto ser uma propaganda “grátis” para o fabricante, nós sempre arcamos com algum custo, seja o do envio do material de volta, o do imposto de importação, e, no caso dos testes escritos por outras pessoas que não eu, o custo da mão-de-obra. Ou seja, nós PAGAMOS (e, dependendo do material, muito) para que os nossos testes sejam publicados.
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