Minha história profissional – parte 11

Há uma história de bastidores bem interessante envolvendo a primeira edição do meu livro Redes de Computadores Curso Completo, de 2001, que eu nunca trouxe a público. Mas para contá-la, temos de retroceder um pouco na linha do tempo.

O grosso do meu primeiro livro, Hardware Curso Completo, foi escrito em 1995. Entre o final de 1995 e início de 1996, busquei as quatro maiores editoras especializadas em livros de informática do Brasil para publicá-lo. Três delas (Campus, Makron e Berkeley) rejeitaram o livro, dizendo que livros sobre hardware não vendiam e que a produção era muito cara (muitas ilustrações para serem feitas).

Depois que o livro foi publicado, o pessoal da editora Campus (mais tarde, comprada pelo grupo editorial holandês Elsevier, sendo este o nome pelo o qual ela é mais conhecida atualmente) vivia me sondando para ver se eu trocava de editora. Me ligavam com um papinho “quando você vem aqui pelo centro da cidade tomar um café conosco”? Eu sempre ignorava esses pedidos. Afinal, não quiseram investir na minha carreira quando eu era um mero desconhecido, mas agora, que eu obtive sucesso, me queriam na casa, a investimento zero?

A propósito: eu tinha a carta de rejeição deles presa na minha parede. Era um lembrete diário da minha perseverança mesmo diante das rejeições.

Em 2001, escrevi o livro Redes Curso Completo, em cerca de nove meses. Quando o livro estava prestes a ir para a gráfica (ou seja, o livro já estava pronto e revisado, só faltava a impressão), a Campus entrou em contato com o meu editor na época querendo comprar o meu “passe”. Queriam fazer uma oferta para eu mudar de editora e levar todos os meus livros para lá. Com isto, a editora deu uma pausa na impressão do livro, aguardando o desfecho das negociações.

Tivemos uma série de reuniões, mas eu não gostei da forma de trabalho deles. Eles olharam o sumário do meu livro de redes e queriam que eu modificasse todo o conteúdo para que se adequasse ao que eles achavam que os clientes deles queriam. Além disto, para cada livro de minha autoria, eles queriam saber quais eram os livros concorrentes de outras editoras. A impressão que eu fiquei era que eles não me queriam na casa para escrever livros com uma visão única de um autor que já tinha um público formado, mas sim alguém que fosse escrever livros sob encomenda para concorrer com outros livros que já existiam no mercado.

Eu achei essa linha de raciocínio bastante desqualificadora com o meu trabalho. Partiam do pressuposto equivocado que eu estava escrevendo livros para concorrer com outros que já existiam, e não como eu sendo um autor que lançava tendências: eram os outros que me “copiavam”, e não o contrário. Basta ver que até 1996 só existia outro autor de hardware no mercado (Laércio Vasconcelos), e de forma independente, pois as editoras achavam que o tema “hardware” não vendia, como expliquei. Depois que lancei meus livros, surgiram diversos outros autores surfando a onda.

Além disso, não iria jogar fora nove meses de trabalho só por que outra editora achava que o livro deveria ser diferente, ignorando completamente não só a minha visão para o livro, mas desqualificando a minha sensibilidade em saber o tipo de conteúdo que o meu público queria consumir.

Outro detalhe é que eu não ia ganhar nenhuma grana para fazer a troca de editora: a editora antiga é que ia receber uma bolada para vender o meu passe para a Campus (isto se dava por conta dos efeitos do contrato leonino que eu tinha com a antiga editora).

A gota d’água é que eles estavam achando que era blefe meu e da editora ao dizer que o livro Redes Curso Completo já estava pronto, na gráfica, apenas aguardando a impressão. Eles achavam que o livro não existia e eu o estava usando como carta de barganha na negociação. Talvez por isso a insistência deles em que eu escrevesse um livro diferente do que estava pronto.

Recusei a proposta, e o livro estava nas livrarias uma semana depois, tornando-se um sucesso em vendas.

Depois que eu saí da antiga editora por conta das questões já exploradas na Parte 10, vocês acreditam que a editora Campus me procurou novamente? Fui lá mais uma vez ter uma conversa com eles, mas o papo era o mesmo...

Olhando para trás, não me arrependo nem um pouco da minha decisão de não ter trocado de editora, mesmo dois anos da história acima ter de sair da antiga editora e ficar afastado do mercado por alguns anos. Pois, no final das contas, iria para uma casa onde não teria liberdade criativa e, como autor, isto é inadmissível. Mas o ponto principal da história é mostrar um exemplo real de como algumas pessoas querem o bônus, mas não querem o ônus: não querem investir em profissionais em início de carreira, mas depois que eles ralam para caramba para mostrarem que são craques, aí querem, a custo zero.

• Ler Parte 12
• Ler as demais partes desta série.