Conclusões
Todas as informações apresentadas até o momento são fatos e dados extraídos diretamente dos balanços da AMD. Nada do que falamos até o momento é opinião nossa.
Vamos agora dar um pouco da nossa opinião pessoal em relação à crise financeira da AMD.
Para nós, está claro que a crise financeira foi causada por uma combinação de má gestão, falta de visão estratégica, demora no lançamento de produtos e decisões ruins.
Enquanto a empresa era presidida por seu fundador, a AMD não dependia tanto do mercado de processadores para computadores. É válido lembrar que a AMD, assim como a Intel, é uma empresa de semicondutores fundada na década de 1960, e fabricava outros tipos de chips. Só a partir do momento que a empresa começa a depender mais de processadores para PCs é que ela começa a dar prejuízo e ter problemas.
O grande problema de empresas de capital aberto, em nossa opinião, é que não existe um “dono”. O presidente é um funcionário que ganha o seu salário, independentemente se a empresa dá lucro ou prejuízo. No caso do presidente que é fundador da empresa, ele tem uma relação de carinho que não existe com um presidente com pensamento de “funcionário” e que vem “de fora”.
A decisão mais desastrada da AMD foi a compra da ATI. De acordo com balanços posteriores da AMD, a própria empresa admite que pagou o dobro do valor justo, endividando a empresa e criando uma crise sem precedentes. A integração dos times da ATI e da AMD foi extremamente complicada, que demorou muito mais do que o previsto.
A situação é tão ridícula que hoje (17/02/2023) a NVIDIA, que é uma empresa que fabrica apenas chips gráficos, vale 4,6 vezes mais do que a AMD (e isto considerando-se a impressionante valorização da AMD a partir de 2019 e a compra da Xilinx). Por outro lado, esta diferença de valor de mercado entre as duas companhias era de doze vezes em favor da NVIDIA em 2017.
Durante uma década, vimos a AMD valendo bem menos do que valia antes da compra da ATI. Esta situação só se reverteu ao final de 2016, quando as ações da AMD dispararam em expectativa ao lançamento da microarquitetura Zen.
Em seguida, o mercado começou a mudar com usuários focando mais em dispositivos móveis, e a AMD não apostou nesta transição, tomando decisões “burras”, como vender a parte de chips gráficos para smartphones que herdou da ATI para a Qualcomm – que renomeou a tecnologia para “Adreno” (curiosidade: este nome é um anagrama “Radeon”; a Qualcomm já foi a empresa com maior fatia no mercado de processadores para smartphones e atualmente ocupa o segundo lugar, atrás da Mediatek). E depois a AMD “culpa” em seu balanço de 2012 o prejuízo a fatores externos, como a mudança de gosto do usuário (sem admitir que foi culpa dela própria não acreditar em outros mercados).
A AMD tinha um problema histórico em não dominar processos de fabricação e estar tecnologicamente atrasada em relação à Intel – dois anos, em média –, conforme ela mesmo admite em vários balanços (não estamos aqui dizendo que a Intel é superior à AMD e que preferimos produtos da Intel; apenas repetimos os fatos declarados pela própria AMD em seus balanços). Para diminuir esse atraso, ela usava tecnologia da IBM, gastando milhões de dólares para isso (curiosamente, a GlobalFoundries comprou a divisão de microprocessadores da IBM em 2015). Mas é difícil concorrer com a Intel, que é uma empresa muito maior e tem dinheiro de sobra para investir em pesquisa e desenvolvimento. Este cenário, no entanto, foi revertido em 2018, quando a AMD anunciou produtos fabricados com tecnologia de 7 nm (fabricados pela TSMC), enquanto a Intel luta, desde 2016 para lançar sua tecnologia de 10 nm (finalmente lançada em 2019). Esta inversão na liderança tecnológica é outro ponto que fez a AMD se recuperar a partir de 2018.
Mas, mesmo sabendo que ela não tinha condições de competir de igual para igual contra a Intel, a AMD continuava insistindo em competir diretamente contra a sua maior rival. Isto tanto era verdade que vimos claramente a proporção do faturamento oriunda de processadores para PCs aumentar de 50% nos anos 1990 até 90% em 2006. Só em 2013 a AMD foi se tocar que precisava expandir para outros mercados, conseguindo o contrato para o fornecimento dos chips tanto para o PlayStation 4 quanto para o Xbox One. Neste mesmo ano, a AMD declarou querer que apenas 50% de seu faturamento venha do mercado de PCs até o final de 2015, o que foi de fato atingido.
A decisão da AMD partir para um novo modelo de negócios, sem fábricas, tem suas vantagens e desvantagens. A NVIDIA usa esse modelo de negócios, assim como a ATI usava (e que a AMD continuou, pois os chips gráficos da AMD, mesmo na época que a AMD tinha fábricas próprias, eram fabricados por terceiros). Só que a NVIDIA e a ATI não concorriam diretamente contra a Intel.
A Intel tem fábricas próprias, mas é uma empresa com muito mais dinheiro e pode investir em fábricas, embora é esperado que ela também comece a terceirizar sua produção. A AMD teria de estar muito mais capitalizada para poder investir de forma apropriada em suas fábricas. Nesta linha de pensamento, a decisão de partir para o modelo sem fábricas parece ter sido um bom negócio, afinal a AMD voltou a dar lucro após separar suas fábricas em uma empresa à parte, a GlobalFoundries. Por outro lado, a Intel tendo fábricas próprias acelera a pesquisa e desenvolvimento de novos processadores e tecnologias, embora isto não tenha sido verdade para a tecnologia de 10 nm.
A AMD, em particular durante a gestão de Hector Ruiz, reclamava muito da Intel em seus balanços, mas ela poderia aprender algumas coisas com a Intel e com a NVIDIA. Estas duas empresas têm um marketing extremamente agressivo, que a AMD não tem. Do nosso ponto de vista, como jornalistas e entusiastas, achamos ridículo que no site da AMD seja tão difícil (se não impossível) encontrar informações técnicas mais detalhadas sobre seus produtos. Nos sites da Intel e da NVIDIA é possível encontrar facilmente tais informações.
Tanto a Intel quanto a NVIDIA fazem um marketing agressivo em cima do usuário final, enquanto a AMD tem um pensamento antiquado de ver como seu principal cliente o fabricante de PCs e não o usuário final.
Outro exemplo de burrice da AMD foi a compra da empresa de microservidores SeaMicro por US$ 334 milhões para três anos depois fechá-la. Ela jogava dinheiro no lixo sem poder.
E lembra do computador para mercados emergentes, o “PIC”? Para que perder tempo e dinheiro com esse tipo de coisa que não vai dar dinheiro para a empresa no volume que ela precisa?
Pode ser também uma questão de ego, de executivos querendo impor suas ideias “fantásticas” e tentar deixar algum tipo de legado em vez de pensar no que o mercado está querendo e debater para onde ele está indo e seguir a tendência. É um erro comum de gestão decidir, por comitê, o que o mercado vai querer. Só se esquecem de combinar com o mercado.
A AMD tem jeito? Com certeza, bastando observar a volta por cima a partir de 2018, com a gestão de Lisa Su mostrando a que veio, apresentando resultados financeiros excepcionais a partir de 2019. Engenheira de formação, ela resolveu voltar a investir no feijão-com-arroz da empresa: processadores, que vêm paulatinamente representando uma maior participação no faturamento da empresa. O aumento do preço médio dos processadores e a maior demanda pelos processadores da companhia fizeram com que o faturamento aumentasse, a empresa voltasse a ter lucro após seis anos de prejuízo, e o valor de mercado da empresa aumentasse 1.600% entre 2017 e 2021.
Se a compra da Xilinx em 2022 foi ou não uma boa decisão, só o tempo dirá. Veremos em nossas análises dos próximos anos.
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